Todos nós temos entes aos quais
estamos intimamente ligados e presos de certa maneira. O intrigante do homem é
que ele, querendo ou não, conclui que é necessário haver alguém a quem possa
estar preso como motivo de segurança para sua vida. O apego consiste em ter
necessidade vital da presença daquele, ou daqueles, pelos quais determinamos
essa segurança. Contudo estar apegado com alguém se torna de fato uma
escravidão. Aquele que pratica o apego determina que sua relação e contato
humano se resumam praticamente a essa pessoa ou várias pessoas. O apego
torna-se de certa maneira uma idolatria do outro, ou seja, a necessidade do
outro se torna tão necessária que a vida parece não fluir quando estamos longe
dessas pessoas e acabamos exigindo uma atenção quase que sobrenatural do outro.
Queremos e desejamo-lo somente para nós! Contato de egoísmo com a própria
realidade que nos cerca.
Quem lê esse primeiro parágrafo
logo pensa: “Eu não sou assim!”; “Isso é coisa de louco!”. Contudo a realidade
pressupõe outra situação. A verdade é que de alguma maneira estamos presos a
alguém. Essa relação de apego se torna tão íntima ao homem que chega ao ponto
de tornar-se imperceptível para quem pratica. O triste de todo esse quadro é
ver que muitos fazem ele sem dar-se conta do atraso provocado pelo apego exagerado.
O desejo de ver, ouvir, ler e sentir qualquer coisa da pessoa é tão estridente
que o sufocar é inevitável. Porque se a
pessoa objeto do apego, não for uma pessoa paciente vai sentir-se sufocada em
determinado momento. Chega determinado instante que se torna um vício.
O apego determina, desde o
princípio, um sofrimento a priori, quando não existe resposta recíproca e de
retorno da parte oposta. Porque quem pratica essa ação perceberá o vazio
causado pela ausência de respostas concretas do outro. O mais triste da vida é
pensar que um homem pode reduzir suas expectativas ao coração de apenas alguns.
Esquece ele que a vida é feita de um universo de possibilidades. Esquece ele
que pode conquistar pessoas e coisas melhores e maiores do que estas as quais
tem seu coração preso. Não é capaz de visualizar as demais possibilidades que
pode ter em sua vida.
O desapego pauta antes de tudo
para um caminho da própria descoberta de quem somos e como podemos caminhar
sozinhos. Porque quem ama de verdade coloca em liberdade àquele que ama. O
desapego constrói toda essa premissa da liberdade. Liberdade que prima pelo
deixar partir e o encontrar novamente. O desapego é a arte de aperfeiçoar o amor.
Não consiste em um fingimento de não preocupar-se, nem tampouco em abandonar ao
léu quem se ama, mas de fato deixar ser livre o amado.
É como o caso de uma moça que depois de um relacionamento
de mais ou menos cinco anos foi deixada por seu amado. Depois Chora que nem
Madalena arrependida, dizendo que ama muito o rapaz. Acaba ficando
completamente perdida sem saber o porquê do fim da relação. Já ele bem sabe, afinal
de contas o rapaz em questão sentiu-se sufocado. Ele a ama, contudo um amor sem
liberdade é como viver com uma pedrinha no sapato: você pode até andar,
entretanto ela sempre vai incomodar. Porque ninguém merece alguém te ligando a
cada 5 minutos querendo saber onde você está, com quem e que horas volta. Ter a
obrigação de ver a pessoa todo dia. Ir à casa toda hora ou todo dia. Não coloco
nesse balaio somente e os casais, mas amigos, parentes e a qualquer ser que
respire e esteja enquadrado nessa temática.
O pior de todo esse embaraço é
que a pessoa apegada acredita estar realizando um bem para si mesmo. A verdade
é que o apegado sempre sofrerá muito. Ele sofrerá sempre de uma solidão
enfatizada na ausência do ente objeto do apego. E por fim permanecerá só, pois
ninguém suporta estar preso a alguém da maneira que o apegado imagina ser uma
relação. O apego exacerbado edifica uma verdadeira prisão para o praticante.
Não é difícil em nossos tempos perceber pessoas assim. São tantos os caminhos
de insegurança para nossos dias que muitos acreditam resumir suas seguranças em
pessoas e coisas. Essa segurança na verdade vela por um medo de relacionar-se
com outros pela verdade e pelo desejo da presença.
O desapego é arte de aperfeiçoar
o amor, no sentido de que o amor permanece livre para nós no momento em que
compreendemos que não importa o lugar, onde outro estiver ele vai continuar
sendo nosso de alguma forma. Não é preciso fazer grandes reboliços para chamar
a atenção. Desapegar consiste em compreender que podemos ser capazes de
caminhar sozinhos quando tudo parecer difícil. Quando o outro estiver incapaz
de transmitir um sinal de presença. Devemos abandonar esse sentimento, de que
somente com outro podemos estar seguros. Quando na verdade o sentimento de
segurança é uma disposição interior.
O amor pede passagem das amarras
que prendem teus pés. Das correntes fingidas que prendem teus passos. Quando
estamos presos aos olhos alheios e nos privamos de nossa própria visão. Quando
esquecendo nossas próprias mãos e pés, andamos e tocamos com os sentidos do
outrem. O amor pede passagem para quebrar essa falsa segurança que detemos em
nós. Pássaros não voam enjaulados.
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