Está tão escuro hoje no quarto que sinto os olhos arderem com freqüência quando me infiltro na janela. Talvez seja pelo fato de fazer dias que não vejo a luz. Desde quando? Desde o dia, em que desliguei o telefone e não mais ouvi certas palavras. Eu gritava como que tentando repreender o medo daquilo que me diziam.Ouvia ainda que atento as coisas que eram ditas.Mas não me restava outro caminho se não esse que tomei no dia de hoje. Fechei a porta do meu apartamento e fechei as janelas que teimavam em iluminar a sala de estar. Tirei o cabo do telefone e não mais recebi aquelas ligações desesperadas que me deixaram na caixa eletrônica.
Havia como que uma caixa em volta de tudo. E esta me impedia de ouvir os barulhos que lá fora na rua fazem. De certo ainda ouvi as batidas de desespero na minha porta na última quinta. Se de fato era quinta. Porque até mesmo os calendários me trouxeram desanimo. Por isso recolhi todos. O celular acabou a bateria faz cinco horas. Escondi de mim mesmo o carregador porque sou viciado em celular. Não quero ter chances de ligar para alguém. Não quero ter chances de ligar para você e ter certeza do que foi dito naquela última conversa.Leio alguns livros. Estou comendo macarrão instantâneo faz vários dias. Creio que hoje coloquei no fogo o último pacote.
Seu Olavo - nem tenho certeza se foi ele - colocou a correspondência por debaixo da fresta da porta. Nada de tão interessante. Luz, água, condomínio, e uma fatura a ser paga. Ainda sinto tudo tão escuro.Muito escuro. Tomei sim alguns remédios. Poucos não muito. Mas creio que os suficiente para me fazerem dormir. Talvez seja por isso que sinto o corpo tão leve. Escrevi sim uma carta. Com medo de não mais acordar. Nas poucas palavras escritas a dor de quem deixou poucas lembranças.Poucos amigos. Poucas alegrias que mereçam grandes palavras na missa. Talvez esse sempre fosse meu grande desejo. Dormi serenamente vendo escurecer tudo ao meu redor. Separei o lixo?Sim tenho certeza. Não houve muito o que dizer nesta carta.Na minha memória só as palavras. “Vou embora, não suporto mais essa vida". Nem eu suporto mais de fato essa vida. Não a culpo por ter deixado esse recinto. Minha herança: a dor.
Só me resta dormir, e esperar o dia que vem. Talvez esse sufocar no peito seja isso. Sono.
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